Mank: retrato mediano de um homem fascinante

Bernardo de Quadros Bruno
2 min readApr 2, 2021

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Eu gosto muito dos últimos filmes do David Fincher. Acho que o diretor de Mank se achou completamente nesse estilo calculista e perfeccionista de direção rígida: blocking calculado dos atores, decupagem muito detalhista, montagem ágil e dinâmica. Ele consegue construir uma atmosfera superficial e impessoal (destaque ao uso criativo do CGI) e ao mesmo tempo tensa, que é muito boa. Não me surpreende que os grandes “heróis” do cinema do Fincher sejam um bilionário sociopata que se vende como único criador do Facebook (A Rede Social), investigadores que sacrificam sua vida pessoal em detrimento do trabalho (Zodíaco) ou, simplesmente, o Ben Affleck tentando sustentar as mentiras do sonho americano (Garota Exemplar). Todos personagens que revelam muito mais que suas aparências sugerem. E a história por trás de Herman J. Mankiewicz, também se encaixa nessa questão de fatos apagados por trás de uma realidade opressora, mas as semelhanças param aí. Planos mais longos, maior uso de profundidade de campo, diálogos menos frenéticos, cenários mais vivos e “reais”. Mank vai contra muito do que fez o Fincher se tornar um dos grandes diretores do cinema americano contemporâneo, o que é muito interessante. Ou não?

Mank é um filme sobre Hollywood e as práticas cruéis dos grandes estúdios, não é um filme de cinema ou sobre Cidadão Kane. E é aí que acho que o filme entra numa lógica mais convencional. Diferentemente de Jean-Luc Godard, amante do cinema em primeiro lugar, que se apropriava da estética hollywoodiana e transformava em algo único, diferente e crítico (mas sem perder a paixão), o Fincher pega alguns elementos hollywoodianos e não parece vibrar com essa estética. O oposto que filmes atuais como O Mistério de Silver Lake e Era Uma Vez Em Hollywood fazem sem nunca perder um teor crítico e irônico. Em Mank, momentos de “ápice emocional” como a cena da carta da Lily Collins ou da discussão entre Welles e Mankiewicz são tão dramaturgicamente convencionais quanto a dos filmes dos grandes estúdios feitos hoje em dia e que todo ano são indicados a melhor filme. E isso não é proposital.

Não acho que Fincher vá muito além dessa proposta, interessante mas que se desgasta rapidamente, de usar da estética do cinema hollywoodiano clássico para criticar os criadores dessa estética. Apesar da palhaçada do Fincher tratar a relação de Welles e Mank como a de Zuckerberg e Eduardo de A Rede Social, no final das contas, Mank é um retrato mediano de um homem fascinante rodeado de personalidades fascinantes, se não criticasse tanto a indústria, seria o candidato medíocre perfeito para ganhador do Oscar.

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